Para a economia voltar a crescer, a retomada dos investimentos públicos precisa estar no topo das prioridades do próximo governo. Essa é a opinião do economista Antonio Corrêa de Lacerda. Segundo o boletim Economia em Foco, da AC Lacerda Consultores Associados, nos últimos quatro anos, os investimentos públicos foram de 2,2% do PIB, caindo praticamente pela metade em relação ao período 2013-2016.
Lacerda lembra que, para pagar as despesas obrigatórias de salários, saúde e educação e ainda cumprir a o Teto de Gastos, Emenda Constitucional nº 95, o executivo vem cortando significativamente os investimentos. Para ele, isso deveria ser a última coisa a fazer ou nem mesmo deveria ser feito, muito menos em meio a uma crise, já que todo investimento público gera empregos, fomenta cadeias produtivas e induz a realização de investimentos privados.
Os muitos desafios
Num ano de incertezas em razão das eleições, dos desdobramentos da pandemia de covid-19 e da guerra da Rússia x Ucrânia, o economista André Paiva Ramos – que, junto com Lacerda, faz parte da AC Lacerda Consultores Associados – elenca como principais desafios macroeconômicos o baixo nível de atividade, a pressão inflacionária e a taxa de juros básica muito elevada. “Tudo isso contrai a capacidade de retomada da economia e encarece o crédito aos tomadores finais. As muitas incertezas quanto à condução das políticas econômicas no próximo governo também afetam os investimentos, que acabam sendo adiados”, diz André.
Na visão de Lacerda, a expectativa em 2022 é de poucos investimentos federais, mas governos estaduais — que tiveram um aumento de arrecadação de ICMS sobre combustíveis — tem possibilidade de acelerar seus projetos, especialmente devido às eleições deste ano.
No campo das concessões e privatizações, dentre os desafios estão as falhas do ambiente regulatório, como no caso da reversão de concessões, como aconteceu com o recente comunicado de devolução do Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão. “A nossa legislação é falha nesse sentido e cria insegurança para investimentos. O mercado vai conviver com essa contradição. De um lado, a restrição de investimentos públicos e de outro há ainda insegurança regulatória em concessões”, diz Lacerda.
Em havendo uma reativação econômica, Lacerda prevê que as principais oportunidades para o setor de engenharia e construção estão nos segmentos de construção civil, ferro e aço, além de projetos de engenharia.
Conjuntura
A pandemia é apenas mais um aspecto que pesa na difícil conjuntura econômica brasileira. “O nível de atividade econômica é o menor desde 2014. Depois da forte crise de 2015/2016, a economia cresceu muito pouco, praticamente andou de lado. Aí veio a covid-19 e derrubou tudo. Para 2022, não prevemos crescimento econômico, de forma que o nível de atividades deve permanecer abaixo do verificado em 2014”, analisa André.
Um dos principais problemas apontados pelo boletim Economia em Foco, da AC Lacerda Consultores, é o aprofundamento da desindustrialização da economia. A participação da indústria de transformação no PIB vem caindo e está abaixo de 10%, assim como tem havido rompimento de importantes elos das cadeias produtivas e eliminação de postos de trabalho de qualidade.
Apesar de registrar crescimento em 2021, o nível de produção da indústria de transformação está 14% inferior ao de 2012. Segundo o boletim da consultoria, o macroambiente inóspito e a falta de uma agenda de política industrial desestimulam as indústrias brasileiras a investirem como deveriam em aumento de produtividade e em avanços tecnológicos e inovações. Entre as consequências, destacam-se a insolvência, a dependência de importações e a ampliação da concentração de mercado.
Depois de ultrapassar os 10% em 2021, a inflação deve desacelerar para cerca de 6% em 2022, mostrando que ainda está bastante resistente. Os índices que medem a variação de preços no varejo e no atacado também apontam forte alta, principalmente devido às pressões de custos e, ainda, a problemas de abastecimento. Há muita dificuldade de repassar esses custos ao consumidor final, que, por sua vez, é afetado pelo desemprego, encarecimento do crédito pela alta das taxas de juros e endividamento.
A conjuntura brasileira nada favorável representa um grande desafio para o próximo governo. Para Lacerda, entre as prioridades do novo ocupante do Palácio do Planalto e sua equipe, a retomada dos investimentos vem em primeiro lugar e, para isso, é necessário ter linhas de crédito de longo prazo e em condições adequadas, e não como as atuais, que são onerosas e de curto prazo.
“Os investimentos são fundamentais para um crescimento robusto e sustentado econômica, ambiental e socialmente. O Brasil tem um déficit social antigo e enorme. Temos 29 milhões de pessoas fora do mercado de trabalho. É um problema social, mas econômico também. São pessoas fora do mercado de consumo. O programa do próximo governo federal tem de abarcar todas essas situações e, principalmente, aprimorando restrições fiscais, como o teto de gastos, e adotando um conjunto de políticas que promova a reindustrialização do Brasil”, afirma Lacerda.
Demandas e prioridades
Para André, incluem-se entre as prioridades avançar na reforma tributária e corrigir distorções, buscando ampliar a competitividade do país. “Além da simplificação tributária, é necessário melhorar aspectos de progressividade, melhorando as condições de vida da população e o fomentando o consumo”, afirma.
Na opinião dos economistas da consultoria AC Lacerda, o setor privado e as entidades representativas têm o dever de apresentar suas demandas de forma muito explícita e obter o comprometimento não só dos candidatos ao Executivo, mas também ao Legislativo. Defendem ainda a importância de que as equipes técnicas do governo tenham conhecimento da economia real, para construir políticas e projetos que façam o país avançar. “É preciso qualificar o debate, questionando os postulantes ao Executivo e ao Legislativo sobre qual política econômica se comprometem a adotar”, conclui Lacerda.
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